sexta-feira, 7 de maio de 2010

Espaço ritualístico


O espaço ritualístico escolhido para a composição deste trabalho foi o cemitério local São João Batista, que no inicío do mês de novembro é o que melhor representa os rituais típicos da sociedade, devido a grande comoção em função da data que se dedica aos mortos, o chamado dia dos finados. A maior parte do ano o cemitério é meio que abandonado, mas quando se aproxima novembro os familiares, a comunidade e até as autoridades locais começam a se manifestar para transformar o espaço num lugar mais bonito e porque não dizer, atrativo, já que a data em si atrai multidões dos municípios vizinhos que vem ao local para visitar seus mortos. O cemitério em questão é simples e fica localizado num bairro nobre da cidade; possui duas entradas e uma escadaria que dá acesso ao portão principal. Em seu interior existem algumas capelas construídas por famílias mais nobres da sociedade para dar abrigo aos seus mortos e reunir a família para missas e orações. Existem também túmulos muito bonitos e conservados, adornados por coroas de flores, algumas naturais, outras não. Este aspecto torna-se bastante curioso, pois se percebe através deste fato que as tradições e os rituais não estão mais sendo cumpridos rigorosamente como acontecia no passado. O velho hábito de ir ao cemitério e levar flores para adornar os túmulos dos entes queridos está sendo substituído em função da praticidade. Hoje em dia percebe-se muitos túmulos e capelas adornadas com flores de plástico e materiais reciclados, o que nos leva a crer que as velhas lendas e tradições não existem mais, talvez em função da vida corrida, ou mesmo em função da descrença de certos costumes. O fato é que os rituais continuam, mas as praticas mudaram, bem como os símbolos representativos desta atividade. No local também há sinal de depredação e abandono. Foi-se o tempo em que cemitério era um local sagrado, que não se podia profanar. O respeito aos mortos deu lugar a banalidade. Nos cemitérios urbanos, dificilmente se vê aquelas decorações efêmeras de riquíssimo valor simbólico com cálices, cruzes e resplendores delineados com flores e preenchidos com pétalas, a não ser que a data seja propicia. Era bonito de se ver no passado as flores que davam um colorido especial ao ambiente, mas que em pouco tempo secavam e amontoavam; as velas que iluminavam o local, na esperança de iluminar também o caminho daqueles que amávamos... Flores, velas, beleza, feiúra... Uma alegoria da própria vida. O símbolo mais freqüente são as cruzes, das mais simples as mais exuberantes. Elas não faltam jamais, pois é uma alusão de que o ente que se foi possa estar mais perto de Deus, vivendo no outro plano em paz e uma forma natural de perpetuar a memória daqueles que não estão mais entre nós. Alguns acreditam que velas, flores, cruzes e outros elementos deste tipo são símbolos da morte, mas para os que lidam todos os dias com a morte, ou com o ambiente em si, estes símbolos representam apenas nossas tentativas rituais de ultrapassar esta realidade incontornável. Em suma, este ritual praticado, por vezes mistificado, é mais uma forma que os indivíduos encontram de lidar com a morte, de superá-la, de contorná-la de alguma forma. Já que não é mais possível estar presente na vida dos que se foram, sua lembrança é substituída pelos símbolos de sua presença. O cemitério é enfim, não apenas o local onde a sociedade deposita seus mortos, mas é também um local para refletir sobre quão efêmera e passageira é a vida, sobre como temos dificuldade para lidar com este momento tão temido e inevitável, talvez, cuidando e zelando pelos nossos mortos, estamos garantindo que façam o mesmo por nós, onde quer que estejam.

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